sábado, 18 de julho de 2009

ZÉ SARNEY - AFINAL, A QUEDA DE UM IMPOSTOR?

Por Ipojuca Pontes

"Impostor: Que ou aquele que tem ou pratica impostura; embusteiro" - Novo Dicionário Aurélio

Ao que tudo indica Zé Sarney, o Impostor, tal como Antonio Carlos Magalhães, Jader Barbalho e Renan Calheiros, vai ter de largar - mais cedo ou mais tarde - as delituosas delícias da presidência do Senado Federal, às quais se aferra como um cão faminto diante de um osso suculento.

É verdade que Lula da Silva, o Cínico, faz de tudo para mantê-lo no cargo, visto que dele precisa para traçar o baralho (sujo) da manutenção do poder, vale dizer: 1) Tornar viável a duvidosa candidatura de Dilma "Michael Jackson" Rousseff à presidência da República; 2) Sustentar a subserviência do PMDB e dominar as votações de interesse do governo no plenário do Senado; 3) Controlar com mão de ferro a explosiva CPI da Petrobras, o cofre forte petista; 4) E, o mais importante, ampliar o deletério processo de "transição para o socialismo", objetivo principal do PT desde janeiro de 2003, quando se assenhoreou do Poder.

(Adendo 1: De todo modo, se Lula insistir em manter Zé Sarney na presidência do Senado, como vem fazendo, o desgaste será maior, não só para o seu partido - o famigerado PT, umbilicalmente ligado à corrupção - como para o próprio Zé Sarney, que correrá o risco de ser apedrejado publicamente, como já o foi, de resto, no Paço Imperial do Rio de Janeiro, em junho de 1987, quando dividia o Executivo Nacional com o Dr. Ulysses - o homem que, com a Constituição Cidadã, tornou o "País ingovernável", presa fácil da demagogia utópica da politicagem esquerdista. Só para lembrar: no levante do Paço Imperial, ao apedrejar o atual presidente do Senado, a massa enfurecida gritava em estribilho: "Sarney, salafrário! Está roubando o meu salário!")

De fato, se o leitor examinar com o mínimo de objetividade a vida pregressa do País, há que reconhecer em Zé Sarney o pior e mais nocivo homem público brasileiro de todos os tempos, aí incluído o período do Brasil Colônia, do Império e das duas Repúblicas: a Velha e a Nova. De relance, lembro que alguns cronistas da nossa tumultuada história política costumam citar, como exemplos clássicos de maus homens públicos, Francisco Gomes da Silva, o "Chalaça", vil secretário de Pedro I; Artur Bernardes, que governou (mal) a nação em permanente Estado de Sítio; e, no Brasil moderno, as figuras de Ademar de Barros, Paulo Maluf e Collor de Mello (com o PC Farias à tiracolo) - mas o fato concreto é que Zé Sarney suplantou a todos eles, em ambição, esperteza, pequenez e intrujice.

Com efeito, tudo na atribulada vida do político Sarney carrega o estigma da impostura, a começar pelo nome: de José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, passou à Zé de Sarney (prenome adotado pelo pai) e, afinal, a partir de 1965, se fez José Sarney de Araújo Costa, na certa para esconder a vulgaridade do Ribamar.

O atual presidente do Senado, pelo que se sabe, sem ter feito outra coisa na vida a não ser política, é um homem rico, aliás, riquíssimo. Ele tem propriedades, mansões, bens diversos, salários vultosos, bons dividendos, dólares no exterior, jornal, rádio e televisão, etc. Há quem conteste, todavia, que ele tenha acumulado fortuna de modo ilícito. De fato, morando há mais de 40 anos de graça em palácios, com serviçais, secretárias, comida, transporte aéreo, carro, chofer, gasolina, auxílio moradia, sofisticados plano de saúde, Net, internet, verba de representação e correios, barbeiro, diárias em viagens (para dentro e fora do país), sem falar nas mordomias de praxe - bem senhores, falando francamente, se o homem não tivesse ficado podre de rico poderia até ser mal interpretado.

(Adendo 2: Mas é no plano intelectual que o embuste Sarney atinge o patético. Para se exibir como um "homem público respeitável", o político matreiro, que é incapaz de pronunciar uma frase com fluência e sem tropeços, se apresenta nos ambientes com o apuro de um amanuense formal (jaquetão e bigode pintado de acaju). Por outro lado, para vendar a imagem do "escritor consagrado", não sei se com a grana da Viúva, vez por outra viaja à Paris para lançar livros que ninguém lê, na ilusão subdesenvolvida de que, em assim fazendo, terá assegurado a condição de "personalidade literária", aqui. Por conta de tal engodo, mesmo escrevendo tolas anedotas em forma de má ficção, tornou-se "imortal" da Academia Brasileira de Letras, distinção com a qual procura camuflar, orgulhoso, a reconhecida mediocridade.

Detalhe: nos saraus literários, por sua vez, contraditoriamente, o impostor encena a pachorra do Estadista circunspeto, sem desconfiar que, para a maioria dos presentes, longe de ser "uma personalidade literária", passa por rematado "coronelão" da roça, senhor de práticas políticas ordinárias).

No Maranhão, onde já foi governador e se fez inúmeras vezes (por conta de métodos medievais) deputado e senador, tudo carrega o seu nome ou o nome dos seus familiares: escolas, hospitais, maternidades, praças, avenidas, mercados públicos, estradas, fórum, aeroporto e, segundo rumores, até mesmo a placa de modesto chafariz. Curiosamente, em que pese ter se apropriado do Estado há mais de 40 anos, e feito da filha Roseana governadora (duas vezes), o Maranhão registra os piores indicadores econômicos e sociais do País, segundo dados do IPEA e do IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

É fato que o Maranhão já era pobre antes do advento de Sarney e herdeiros. Com ele no poder, no entanto, as imagens de miséria registradas na reportagem "Maranhão 66" (feita de encomenda por Glauber Rocha, paga à LC Barreto com o mísero dinheiro público), multiplicaram-se aos borbotões.

Com efeito, a partir da Dinastia Sarney, iniciado com o próprio Zé em janeiro de 1966, o Estado nordestino virou uma calamidade nacional: ali se encontram, ainda hoje, os piores índices de renda per capita do país, o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a maior taxa de mortalidade infantil, a maior taxa de analfabetismo, a menor taxa de escolaridade, o maior número de habitações sem serviços de água, esgoto e energia elétrica - e por ai segue o barco das aflições. É ver (e ouvir) para crer: na terra do clã Sarney, a infelicidade chegou a tal ponto que o nativo graceja chamando-a de "Estado do Piorão" - a reunião dos fundos do Piauí com todo território do Maranhão.

No entanto pior, muito pior, se deu quando o político matreiro chegou à Presidência da República, cargo que assumiu inadvertidamente por conta da morte súbita de Tancredo Neves. Nele, Sarney ultrapassou todos os índices de incompetência e pusilanimidade, conduzindo um governo caótico que deixou como legado a hiperinflação anual de 1.751% - o que decerto fez como que o povo carioca, num ímpeto de desespero, o apedrejasse em praça pública - fenômeno único na vida política nacional.

No cargo de presidente, o "Estadista do Brejal dos Guajás" transformou a nossa vida pública numa extensão da privada (me refiro, tal como o Barão de Itararé, ao vaso sanitário). Permissivo, mais que permissivo, relapso, o velho "coronelão" fez de tudo para arruinar a vida do povo brasileiro que o malfadado destino, por obra do acaso, lhe colocou nas mãos. Tal qual um estróina febril, ele criou ministérios inúteis, desperdiçou bilhões (de cruzeiros e cruzados) em obras inacabadas; fomentou como ninguém (até então) o empreguismo, distribuindo concessões de rádios e televisões a mancheias em troca de votos e apoio político (objeto de rumorosa CPI); e, o mais daninho, prodigalizando subsídios e isenções fiscais em profusão, enriqueceu milhares de parasitas e levou o País à desagregação social e à corrupção desenfreada.

Adendo 3: A permanência de Sarney na Presidência da República foi tão acentuadamente nefasta que o próprio Lula, cínico que nunca vê corrupção em parte alguma, em discurso público pronunciado em 1987, em Sergipe, tratou-o por "impostor e ladrão"; e por causa de sua permissiva gestão como presidente, Collor de Mello, até então obscuro governador das Alagoas, se fantasiou de "Caçador de Marajás" e candidatou-se à Presidência da República, prometendo prendê-lo caso chegasse ao Palácio do Planalto - promessa que, obviamente, nunca cumpriu, tornando-se hoje um seu aliado).

Depois de levar o País à ruína, Zé Sarney, longe de ser preso ou mergulhar em merecido ostracismo, arrumou um mandato de Senador da República pelo Amapá, Estado que estrategicamente ajudou a criar. E a partir daí, prestando total vassalagem às figuras de Itamar Franco, Fernando Henrique (duas vezes) e Lula da Silva - como antes servira aos deletérios presidentes Jango e Jânio e, a partir de 1964, aos "ditadores militares" -, o virtuoso literato de "Brejal das Guajás" (tido por Millôr Fernandes como um "Bestialógico em estado puro") se fez três vezes Presidente do Senado, cargo que atualmente ocupa, mal e porcamente. Neste posto, sua ligação com escândalos os mais cabeludos atingiu tal evidência, que o grosso da população brasileira quer vê-lo pelas costas. (Vide, s'il vous plait, na Internet e nas secções Cartas do Leitor dos principais jornais do País, a campanha "Fora Sarney").

Mas, verdade seja dita, não há nada de novo front. Como presidente do Senado, Sarney não mudou milímetro na postura de político manhoso, esperto, leniente e pusilânime. Desde que ocupou o posto (pela primeira, em 1995), permitiu que ali se instalasse uma verdadeira quadrilha organizada, tendo à frente uma "cria" sua, Agaciel Maia, o ex-diretor-geral do Senado, funcionário que omitiu da declaração patrimonial uma mansão de R$ 5 milhões, além de manter sob injustificável sigilo mais de 660 "atos secretos", abrangendo os mais diversificados tipos de fraudes e irregularidades que permeiam as páginas do vasto Código Civil.

(Adendo 3: No resumo da ópera, são atos vergonhosos que, em parte tornados públicos, prenunciam a total desmoralização do Senado Federal, e de seus representantes, para o escárnio da Nação. Estampados em manchetes de jornais, eles evidenciam os esquemas de nepotismo, apropriações indébitas, contratações ilícitas, desvios de verbas, malversação do dinheiro público, abusos orçamentários, mordomias de toda ordem - em suma, um variado repertório de fatos escandalosos que só fazem lembrar de perto o cardápio de desgraças que acabou por fulminar, entre 1985/1990, a "Nova República" presidida pelo atual senador Zé Sarney).

No que se refere, em particular, ao prontuário de denúncias contra o temerário senador do Amapá, a imprensa ressalta seu envolvimento com a nomeação sigilosa de parentes, neto e afilhados (mais de dez); posse indevida de auxílio-moradia (Sarney recebia R$ 3.800, mesmo dispondo de duas mansões em Brasília, um delas residência oficial do Presidente do Senado); soma ilegal de dólares no exterior; requisição de seguranças do Congresso (em Brasília) para vigiar sua residência em São Luís (em que pese ser senador pelo Amapá); criação, para o deleite de apaniguados, de 50 diretorias supérfluas no Senado Federal; uso de funcionária da Casa na assessoria de suas campanhas eleitorais; ocultação à Justiça Eleitoral de imóvel de sua propriedade, no valor de R$ 4 milhões (pecadilho que, em nota, o Estadista atribuiu à "erro do contador"); e, por último, mas não menos escabrosa, a denúncia de que a Fundação que traz o seu nome e da qual é presidente de honra, desviou verba de R$ 500 mil da Petrobras ("patrocínio cultural", via lei Rouanet) para empresas fantasmas e da sua própria família.

Tal soma de arbitrariedades, no entanto, não significa grande coisa se comparada ao mal que o "legislador" Sarney vem causando ao País ao longo dos anos. É de sua lavra, ou pelo menos traz a sua assinatura, o encaminhamento ao Congresso Nacional de leis que, bem examinadas, em conjunto ou isoladamente, dividem a alma da Nação, criam privilégios, punem economicamente a população, aviltam as pessoas mais pobres, estimulam a malandragem, desestimulam o mérito, estabelecem a discórdia e, o mais nocivo - corrompem e minam a democracia formal.

Querem um exemplo? Pois bem: por trás da discriminatória Lei de Cotas que institui o obrigatoriedade do aproveitamento de negros e pardos nas universidades públicas, atendendo a grupos empenhados em acirrar o preconceito racial como forma de luta de classes está dedo de quem?

Quem é o mentor da lei de incentivos fiscais na área da cultura (hoje, lei Rouanet), responsável por elevado índice de malversação dos recursos oficiais; pela expansão de "castas culturais" parasitárias viciadas em mamar nos cofres públicos e pela substituição da obra de arte pela propaganda ideológica e a predominância do pensamento totalitário nas produções culturais, deflagradora da permanente crise de criatividade nacional?

E quem, subserviente às esquerdas de todos os matizes, esteve por trás do reatamento das relações diplomáticas do Brasil com a miserável Cuba de Fidel Castro, o mais empedernido e sanguinário ditador da América Latina em todos os tempos, responsável pela transformação da ilha numa vasta prisão e pela morte direta de 120 mil cubanos?

E quem, na certa para demonstrar independência em face dos militares de 64 (aos quais obedeceu como um vira-lata), rompeu relações diplomáticas com a China Nacionalista (Formosa) e as restabeleceu com a velha China Vermelha, ao lado de Cuba e da Coréia do Norte, a mais pétrea ditadura comunista em vigência?

E só para não ir mais adiante neste rol de iniqüidades: quem, para preservar os interesses espúrios de Lula no seu primeiro mandato, procurou dificultar por todos os meios à instalação da CPI do "Mensalão", justamente o inquérito que cassou o mandato de Zé Dirceu, o segundo homem na hierarquia do governo petista?

Resposta: José Sarney, o impostor que se finge de ofendido diante das graves acusações que lhes são imputadas, figura magna que corre atrás de Lula, seu parceirinho, para salvaguardar míseras regalias e adiar uma queda que moralmente já se deu aos olhos da Nação.

(Adendo final: Figura de pantomima, mas, sobretudo, personagem nocivo à vida pública brasileira, Zé Sarney está a merecer de algum autor teatral entrecho de uma farsa trágica. Não precisa, naturalmente, para fazê-la, ser dramaturgo da estatura de um Gogol ou de Antonio José da Silva, o Judeu. Seria pedir demais, claro. Para a tarefa, um entremez circense de autor do porte de Gugu Olimecha já dava para quebrar o galho. E não deixaria de ser curioso ver um tipo ladino, capaz das mais incríveis estripulias, impostar a virtuosidade do Eremita Simão. Ou mesmo, de forma melancólica, ver o personagem burlesco levar adiante o trabalho sujo do poder (esquerdista) para, logo depois, por ele ser execrado. Sim, poderia render bom caldo! Mas, enquanto este momento não chega, o certo será o nativo mover ação pública contra este mau político que, na Presidência do Senado, afirmando servir à Nação, dela se serve há décadas, atingindo-a profundamente. Se possível, com urgência!).

segunda-feira, 13 de julho de 2009

GOLPE DE ESTADO EM HONDURAS?

Por Cícero Harada
"Golpe de Estado em Honduras". É a manchete de todos os meios de comunicação. Afinal, o que está ocorrendo? Desde março, o presidente Manuel Zelaya resolveu propor um plebiscito para que assembléia constituinte possibilitasse, entre outras alterações, a reeleição de presidente. Tanto o Congresso Nacional como a Corte Suprema de Justiça, posicionaram-se contra a proposta. No dia 23 de junho, o Congresso aprovou lei que proíbe a realização de referendos ou plebiscitos 180 dias antes ou depois de eleições gerais, interceptando os planos de Zelaya.

Em virtude disso, o general Romeo Vasquez, chefe do Exército, e demais comandantes militares resolveram não entregar as urnas para votação "para não desrespeitar a lei". O presidente Zelaya destituiu general Vasquez da chefia. Os chefes da Marinha e da Aeronáutica renunciaram em protesto.

O presidente e seus simpatizantes entraram em uma base militar e retiraram as urnas lá guardadas.

A Corte Suprema decidiu favoravelmente à reintegração do gerneral Vasquez no cargo de chefe do Exército. O presidente Zelaya afirmou que não obedeceria a decisão, porque "a corte, que apenas faz justiça aos poderosos, ricos e banqueiros, só causa problemas para a democracia."

No dia 28, Zelaya foi preso pelo exécito por ordem da Corte Suprema, por ter desobedecido a ordem judicial de não realizar a consulta.

O Congresso leu carta de renúncia atribuída a Zelaya e desmentida por este e empossou como presidente interino, Roberto Michelleti, até então presidente do Congresso.

Honduras teve um longo período de ditadura militar que terminou com a eleição de uma Assembléia Constituinte em 1980, a promulgação da atual Constituição de 1982 (http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Honduras/hond82.html), mesmo ano da posse do primeiro presidente eleito, Roberto Suavo Córdova.

Um povo que sofreu longos anos de autoritarismo militar, manifesta da maneira mais clara e contundente em sua Constituição, que optou por uma democracia em que a alternância do poder é mandamento fundamental e intocável. Nada pode ameaçar nem de leve esta característica republicana. A rigidez constitucional nesse ponto barra qualquer pretensão de perpetuação no poder.

O artigo 239 da Constituição hondurenha prescreve que "o cidadão que tenha desempenhado a titularidade do Poder Executivo não poderá ser Presidente ou Designado. Aquele que ofender esta disposição ou propuser sua reforma, bem como aqueles que a apóiem direta ou indiretamente, terão cessados de imediato o desempenho de seus respectivos cargos e ficarão inabilitados por dez anos para o exercício de toda função pública".

Note bem que em Honduras a simples proposição da reforma, visando a um novo mandato faz cessar de imediato o exercício do cargo, o dispositivo não excepciona o cargo de presidente.

No Título VII, Da Reforma e da Inviolabilidade da Constituição, Capítulo I, Da Reforma da Constituição, o artigo 374 prescreve a cláusula pétrea da impossibilidade de reeleição nos seguintes termos: "Não se poderá reformar, em nenhum caso, o artigo anterior [ trata da reforma da constituição ], o presente artigo, os artigos constitucionais que se referem à forma de governo, ao território nacional, ao prazo do mandato presidencial, à proibição para ser novamente Presidente da República, o cidadão que o tenha exercido a qualquer título e o referente àqueles que não podem ser Presidentes da República no período subseqüente."
Aqui está evidente a cláusula pétrea que proíbe a reeleição de Presidente da República.

O artigo 4º é de clareza solar ao definir constitucionalmente o delito contra a alternância do poder: "A forma de governo é republicana, democrática e representativa. É exercido por três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, complementares e independentes e sem subordinação. A alternância no exercício da Presidência da República é obrigatória. A infração desta norma constitui delito de traição à Pátria."

Evidente que Zelaya não infringiu esta norma, queria e precisava alterá-la.
No Capítulo III, Dos Cidadãos, o artigo 4º estabelece: "A qualidade de cidadão perde-se: (...) 5. Por incitar, promover ou apoiar o continuísmo ou a reeleição do Presidente da República;".
Por outro lado, o artigo 238 arrola os requisitos necessários para ser Presidente do seguinte modo: "Para ser Presidente ou Designado à Presidência, requer-se: (...) 3. Estar no gozo dos direitos de cidadão;".

Aqui, uma enorme dificuldade constitucional para Zelaya. Talvez a maior blindagem contra a reeleição. A prova do fato, no caso, notório, de conhecimento geral de que promovia e lutava por seu próprio continuísmo, faz perder a cidadania, um dos requisitos essenciais não só para assumir o cargo, mas também para manter-se como Presidente da República.

O artigo 245 esclarece "o Presidente da República detém a administração geral do Estado: são suas atribuições: 1. Cumprir e fazer cumprir a Constituição, os tratados e convenções, leis e demais disposições legais". (...) "16. Exercer o comando em Chefe das Forças Armadas em seu caráter de Comandante Geral, e adotar as medidas necessárias para a defesa da República;".

No Capítulo X, Das Forças Armadas, o artigo 272 dispõe que "As Forças Armadas de Honduras são uma Instituição Nacional de caráter permanente, essencialmente profissional, apolítica, obediente e não deliberante. São constituídas para defender a integridade territorial e a soberania da República, manter a paz, a ordem pública e o império da Constituição, os princípios do livre sufrágio e a alternância no exercício da Presidência da República."

Note-se que o Presidente é o comandante supremo das Forças Armadas. Estas devem obediência ao Chefe de Estado, na medida em que este obedeça a Constituição e, no caso, esta obriga expressamente que as Forças Armadas defenda a alternância do exercício da Presidência da República. No momento em que o presidente pretende a permanência por meio da reeleição, descumprindo as normas constitucionais e decisões da Corte Suprema de Justiça de Honduras, a ordem de prisão emanada por este Tribunal haveria de ser cumprida.

Os fatos e o conjunto das disposições constitucionais citadas mostram que, em Honduras, não houve golpe de Estado. Hans Kelsen ensinava que o golpe de Estado "instaura novo ordenamento jurídico, dado que a violação do ordenamento precedente implica também na mudança da sua norma fundamental e, por conseguinte, na invalidação de todas as leis e disposições emanadas em nome dela". Trata-se de poder de fato a impor-se contra a ordem jurídica em vigor, instituindo novo ordenamento. Em Honduras, o modelo bolivariano do presidente foi repelido graças a uma Constituição prenhe de anticorpos a estancar a tentação do continuísmo e do caudilhismo latino-americano. Lá se evitou o golpe e se defendeu a Constituição e a lei.

Agora, forças internacionais terríveis levantam-se contra o "golpe de Estado" em Honduras. Da ONU à OEA, passando pela ALBA (Aliança Bolivariana para as Américas), de Chávez, Lula e Fidel a Hillary Clinton e Obama. Lançam foguetes para matar uma mosca. Não é de hoje que Honduras, um pequeno e fraco país, depende dos Estados Unidos. No século XX, a United Fruits Company e a Standard Fruit Company, companhias bananeiras estabelecidas em Honduras, punham e depunham presidentes, controlavam o Congresso, faziam aprovar leis. Mesmo no início do regime democrático nos anos 80, Honduras permitiu aos Estados Unidos o uso de seu território como base estratégica para ações contra a Nicarágua. A ONU, por decisão unânime dos países -membros, exige a restauração de Zelaya e Organização de Estados Americanos (OEA) dá um ultimato para que o governo interino o reconduza à presidência. E o império? E Obama? E a Constituição de Honduras? E Honduras? Ora, Honduras, ora, ora, a Constituição de Honduras...

*Cicero Harada, advogado, conselheiro da OAB-SP, presidente da Comissão de Defesa da República e da Democracia da OAB-SP, foi Procurador do Estado de São Paulo.

HORROR E INSENSIBILIDADE

Por Olavo de Carvalho

Na década de 60, as organizações de esquerda tinham de se esforçar muito para conseguir recrutar dez militantes entre cada cem ou duzentos jornalistas. A lei que tornou obrigatório o curso universitário para o exercício da profissão mudou isso completamente, entregando sucessivas gerações de jovens desmiolados à guarda de doutrinadores e recrutadores bem capacitados. A conversão maciça da classe jornalística ao esquerdismo tornou possíveis fenômenos como o da ocultação geral do Foro de São Paulo e a farsa da eleição presidencial de 2002, um arranjo entre partidos de esquerda, com exclusão de toda oposição possível, celebrado cinicamente pela mídia nacional em peso como uma apoteose da livre concorrência democrática.
O STF fez muito bem ao eliminar a pérfida exigência do diploma, armadilha maquiavélica que rebaixou a qualidade dos nossos jornais e reduziu sua credibilidade ao ponto de que hoje eles não vendem mais exemplares do que o faziam nos anos 50, quando a proporção de analfabetos em nossa população era imensamente maior.

No entanto, a simples eliminação desse instrumento de seleção ideológica não basta para garantir que um pluralismo de verdade venha a reinar na nossa imprensa. Há meios de controle mais sutis e eficientes do que a imposição legal direta. No seu livro The True Story of the Bilderberg Group (Chicago, Independent Publishers Group, 2009), o jornalista espanhol Daniel Estulin mostra como essa plutocracia globalista, empenhada na construção de uma ditadura mundial, conseguiu se manter oculta desde 1954 até pelo menos 1998, estigmatizando como "teoria da conspiração" qualquer tentativa de revelar sua existência: seus componentes simplesmente compraram todos os grandes jornais e redes de TV dos EUA e da Europa. Isso determinou uma mudança mais profunda das funções do jornalismo do que a maioria da população pode ainda conceber. Como o objetivo da elite globalista é derrubar a economia americana e implantar em cima de seus escombros um novo sistema com moeda mundial unificada, impostos globais e administração burocrática planetária, as notícias, na quase totalidade da mídia, já não são selecionadas por nenhum critério de importância objetiva, mas pelo serviço que prestem à programação mental das multidões, de modo a fazê-las aceitar passivamente mudanças drásticas que em condições normais suscitariam explosões de ódio e revolta. A supressão e a manipulação tornaram-se gerais e sistemáticas, ao ponto de atentar diariamente contra a dignidade da inteligência humana e de transformar os mecanismos eleitorais da democracia num mero jogo de aparências.

Quando a elite globalista faz eleger presidente dos EUA um desconhecido, proibindo por todos os meios qualquer investigação séria da sua biografia e reprimindo por toda sorte de ameaças a exigência de que ele apresente seus documentos pessoais, é claro que a noção de "transparência" se transformou numa utopia inalcançável e está instaurado o império do segredo. Quando o indigitado mata um mosquito, compra um cachorro ou brinca de "dama por um dia" nos jardins da Casa Branca, de mãos dadas com a digníssima, o fato é noticiado com imenso alarde em todos os jornais e noticiários de TV, mas até atos oficiais do seu governo, quando arriscam criar alguma resistência, são omitidos por completo ou publicados com discrição que beira o silêncio.

O mesmo acontece com inúmeras notícias de importância histórica mundial que, se reveladas, teriam o dom de despertar as multidões do torpor hipnótico que as imobiliza e incapacita. Dificilmente o leitor encontrará nas páginas dos jornais, tão cuidadosamente foi escondida, a notícia de que Kaing Guek Eav, ex-diretor do sistema de prisões no regime comunista do Camboja, confessou ter mandado assassinar sistematicamente milhares de crianças, filhas de prisioneiros políticos, para que não tentassem vingar seus pais depois de crescidas (v. http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRSPE55705320090608). Nada ilustra melhor a natureza do comunismo. Essas crianças não foram mortas acidentalmente por bombas durante uma guerra. Se o fossem, e as bombas fossem americanas, estariam em todas as primeiras páginas como provas da maldade capitalista. Como foram assassinadas deliberadamente, e o foram pelo simples crime de ser crianças, é preciso abafar o horror para que, no mínimo, as massas continuem na ilusão do equivalentismo moral entre os países comunistas e os EUA.

Do mesmo modo, as vítimas das FARC e do terrorismo latino-americano em geral, brasileiro inclusive, são meticulosamente excluídas do noticiário, proibidas de entrar no círculo da piedade humana e esquecidas, por fim, como meros dejetos acidentais indignos de atenção.

Enquanto isso, a mídia inteira considera normal e aceitável publicar palavras como estas do Dr. Emir Sader: "Há personagens com uma tal estatura histórica que, independente dos adjetivos e de todos os advérbios, ainda assim não conseguimos retratá-los em nada do que podemos dizer ou escrever. O que falar de Marx, que permaneça à sua altura? O que escrever sobre Fidel? ... O Che é um desses personagens cósmicos."

Num rápido manejo de teclado, criminosos desprezíveis, mentores de Pol-Pot, são elevados às alturas sublimes do indizível, do inefável, do transcendente à linguagem humana. Será exagero chamar isso de idolatria psicótica? Mas mesmo os que não apreciam o comunismo aceitam essa monstruosidade em nome da "diversidade de idéias", como se a matança deliberada de crianças fosse uma idéia, uma hipótese, um mero jogo acadêmico.

A longa convivência com essas enormidades, forçada diariamente pela mídia, dessensibiliza as consciências e as torna incapazes de perceber qualquer diferença entre a santidade e o crime, entre a virtude e a abominação. Na mesma medida e pela mesma razão, a estatura moral das sociedades democráticas vai baixando, e, com a ajuda de milhões de emires sáderes, os Ches e Pol-Pots se aproveitam disso para ostentar mais um pouco da sua infinita superioridade moral, anjos de bondade que pairam no céu, longe do "inferno capitalista".

Fonte: Diário do Comércio, 22 de junho de 2009

domingo, 12 de julho de 2009

CORAÇÕES PERTURBADOS

Por Russel Shedd


Antes de Jesus ser preso, na noite em que foi traído por Judas, Ele falou as seguintes palavras de encorajamento para seus discípulos: “Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus, creiam também em mim” (Jo 14.1, NVI). Quem não tem experimentado ansiedade e medo ao enfrentar um futuro desconhecido que promete perigo e assombro? A insegurança intensa e os temores horríveis fragilizam as emoções e perturbam o coração.


Ameaças físicas tiram a paz da pessoa ameaçada porque ela não pode calcular a intensidade do sofrimento que virá. A imaginação age como um carrasco desmontando a segurança da vida interior diante da possibilidade de torturas ainda não sentidas. O sofrimento, que somos incapazes de processar, aflige a alma com dores quase reais, dores agudas e insuportáveis.


Perturbação ocorre quando um médico anuncia tristemente que o câncer que devora as células saudáveis não tem cura. Quais são os sentimentos que desestabilizam o coração no momento em que um passageiro, olhando pela janela de um jato transatlântico, vê um dos motores lançando chamas e fumaça em cima do mar?


Marcos informa que, na noite da traição, os discípulos fugiram (14.50), uma reação natural ao se confrontar com uma ameaça que ultrapassa os recursos disponíveis ao coração. Pedro, mais corajoso, acompanhou o desenvolvimento mantendo sua distância do foco do perigo. Quando, porém, foi acusado repetidas vezes de ser seguidor do réu, negou com veemência e juramentos, afirmando que não era. Aí está mais uma maneira de se tentar escapar do perigo assombroso.


Naquelas horas em que o perigo mortal se aproximava, Jesus declarou: “Não se perturbe o seu coração; creiam”! Quando a mais adequada escapatória for negar, jurar inocência e fugir para se esconder, é bom ouvir do Senhor: “Não se perturbe o coração”. O escudo para o crente fiel continua sendo “Creia”. Crer, no sentido empregado por Jesus, significa confiar na soberania dEle e na todo-poderosa transformação da ameaça em bênção.


Crer em Cristo significa confiar nAquele que, de sua espontânea vontade, aceitou a cruz e todas as agonias inconcebíveis da morte do Filho perfeito. O profeta Isaías relatou esta verdade: “Meu servo justo justificará muitos e levará a iniqüidade deles” (53.11, NVI). Os piores e mais terríveis sofrimentos que a vida ou a morte podem lançar sobre nós foram levados pelo nosso substituto divino. “Ele foi entregue à morte por nossos pecados e ressuscitado para nossa justificação” (Rm 4.25). É essencial que creiamos nesta verdade para nos beneficiarmos deste recurso eterno.


“O aguilhão da morte é o pecado”, disse Paulo (1 Co 15.26), mas se Jesus tomou sobre si o castigo de nosso pecado, que sofrimento sobrará para justificar os nossos temores? Receber pela fé esse preciosismo deve anular a ansiedade e o medo. Logo em seguida, após a ressurreição de Jesus, Pedro mostrou uma invejável segurança e coragem. Acusou os judeus na mesma cidade em que Jesus foi condenado e crucificado. “Vocês”, disse ele, “com a ajuda de homens perversos, o mataram, pregando-o na cruz” (At 2.23b, NVI).


O que mudou nesse discípulo amedrontado, que buscava com juramentos negar sua passada intimidade com Jesus?


“Mantenha a si em paz, primeiro”, disse o sábio Thomas a Kempis, “e então você poderá pacificar outras pessoas. O homem pacífico realiza mais bem do que aquele que é erudito... O homem bom, pacífico, vira todas as coisas para o bem” (A Imitação de Cristo, Shedd Publicações, p. 62). Mas o caminho da paz depende da fé em Deus e no Senhor Jesus, que passou pelo vale profundo da morte e falou para seus seguidores: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou, não vo-la dou como a dá o mundo.


Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” (Jo 14.27, RA). Paulo descreve esta paz que excede todo entendimento como “fruto do espírito”, junto com o amor e a alegria (Gl 5.22). Não se compara com a paz que conversas com um psicólogo possam prover nem uma solução inesperada para uma ameaça sombria. Se um dos maiores males que afligem a civilização ocidental hoje é o stress, resultando em depressão, vale a pena atender a recomendação de Jesus Cristo: “Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus, creiam também em mim”!

sexta-feira, 10 de julho de 2009

JOÃO CALVINO, O CÉREBRO DA REFORMA

Hoje, sexta-feira, dia 10 de julho de 2009, no mundo inteiro, os protestantes reformados estarão celebrando o quinto centenário do nascimento do reformador João Calvino. Ele nasceu no dia 10 de julho de 1509 na França e morreu no dia 27 de maio de 1564 em Genebra, na Suíça. Calvino foi o maior expoente da reforma. Influenciou não apenas a teologia, mas, também, a economia, a política e a educação. Destacaremos quatro áreas da vida desse gigante de Deus.

1. A teologia de Calvino - O reformador João Calvino foi o sistematizador da doutrina reformada. Aos 26 anos de idade escreveu As Institutas da Religião Cristã, fazendo uma exposição do Credo Apostólico. Esta obra tornou-se a maior referência teológica de todos os tempos. É muito importante ressaltar que Calvino não foi um inovador. Ele voltou à doutrina dos apóstolos. Ele voltou às Escrituras. Ele tinha um alto conceito da Palavra de Deus e esmerou-se em ensiná-la com irrestrita fidelidade. A influência de Calvino na teologia é tão destacada, que a doutrina reformada foi cognominada depois de sua morte de Calvinismo. No Sínodo de DORT, na Holanda, mais de cinqüenta anos depois da morte do reformador, cunhou-se o que nós chamamos de cinco pontos do Calvinismo: Depravação Total, Eleição Incondicional, Expiação Limitada, Graça Irresistível e Perseverança dos Santos.
2. A pregação de Calvino - Calvino foi um expositor bíblico. Pregou quase toda a Bíblia, usando o método lectio continua, expondo as Escrituras livro por livro, capítulo por capítulo, versículo por versículo. Calvino foi um exegeta extraordinário. Ele conhecia profundamente as línguas originais, a tal ponto de ler direto no Hebraico quando pregava no Antigo Testamento e direto no Grego quando pregava no Novo Testamento. Calvino pregava em média três vezes por semana. Ele foi essencialmente um pregador, um homem do púlpito. Para ele o púlpito era o trono de Deus na terra, de onde Deus governa o seu povo. Ouvir a exposição das Escrituras é ouvir a própria voz de Deus.

3. A prática pastoral de Calvino - Calvino não foi um homem sisudo, frio e distante das pessoas. Ao contrário, era um devotado pastor de suas ovelhas. Mesmo com uma agenda tão congestionada, ainda encontrava tempo para visitar o rebanho e orar com o seu povo. O ministério de Calvino abrangia um horizonte muito mais amplo do que apenas o cuidado da igreja local em Genebra. Ele era consultado por pastores e concílios de vários países para dar orientação à luz das Escrituras. Ele viajava para atender muitos convites. Calvino era um apologeta incomparável e ajudou a igreja do seu tempo a resolver os mais intrincados conflitos teológicos, sempre se pautando pela fiel exposição da Palavra. Mesmo atormentado por constantes dores e enfermidades, Calvino respondia inúmeras cartas, escrevia muitos livros e pregava com freqüência regular.

4. A influência social de Calvino - Calvino influenciou não apenas a igreja, mas, também, a sociedade como um todo. Ele fundou uma academia em Genebra, onde não faltou o curso de Teologia. Ele preparou missionários e os enviou para o mundo inteiro, inclusive para o Rio de Janeiro. Ele acolheu os foragidos de guerra e fez de Genebra um lar hospitaleiro para os que buscavam refúgio. Genebra foi transformada na mais esplêndida maquete do Reino de Deus na terra, sobretudo, pela pregação desse destemido reformador. Calvino influenciou a política, a cultura e a economia. Ele foi intelectual, sem deixar de ser piedoso. Ele foi um homem à frente do seu tempo. Depois de quinhentos anos de seu nascimento, ainda exerce decisiva influência em todo o mundo ocidental, especialmente no contexto das igrejas reformadas. Rendemos glórias ao nosso Deus por tão preciosa vida!
Por Hernandes Dias Lopes

CALVINO, 500 ANOS

O dia 10 de julho marca a data memorável dos 500 anos desde o nascimento de João Calvino. Contrário ao que muitos pensam, ele não criou ou formulou novas doutrinas, mas foi hábil sistematizador das verdades bíblicas, exemplo de devoção e exegeta preciso, deixando esse legado precioso, que já atravessa cinco séculos!

Calvino “está um nível acima de qualquer comparação, no que diz respeito à interpretação da Escritura. Os seus comentários precisam ser muito mais valorizados do que quaisquer dos escritos que recebemos dos pais da igreja”! Esse endosso entusiasmado de Calvino e de seus dons como comentarista e intérprete bíblico foi emitido por aquele que é considerado o seu grande inimigo: Jacobus Arminius! Charles Haddon Spurgeon, registra isso e classifica o comentarista Calvino como “príncipe entre os homens” e apresenta, ainda, a citação favorável de um Padre Católico Romano (Simon): “Calvino possui um gênio sublime”.

O que levaria Armínio, que divergiu com tanta intensidade da compreensão calvinista da soberania de Deus e da extensão da escravidão ao pecado na qual se encontra a humanidade; ou mesmo um católico romano, com sua discordância do modo de salvação defendido por Calvino, pronunciar tais elogios sobre João Calvino?
Certamente eles se rendem à precisão, devoção e seriedade com as quais João Calvino aborda a Palavra Sagrada, em seus escritos. Spurgeon destaca a sinceridade de Calvino e a tônica que o classifica como um exegeta, em paralelo a todas às suas demais qualificações. Ele disse, “a sua intenção honesta foi a de traduzir o texto original, do hebraico e do grego, com a maior precisão possível, partindo desse ponto para expor o significado contido nas palavras gregas e hebraicas: ele se empenhou, na realidade, em declarar não a sua própria mente acima das palavras do Espírito, mas a mente do Espírito abrigada naquelas palavras”. É por isso que Richard Baxter deu esse testemunho: “Não conheço outro homem, desde os dias dos apóstolos, que eu valorize e honre mais do que João Calvino. Eu me aproximo e tenho grande estima do seu juízo sobre todas as questões e sobre seus detalhes”.

É nessa linha e atribuindo esse valor, que devemos receber e apreciar os escritos de Calvino. Além do mais conhecido - As Institutas da Religião Cristã (tradução curiosa, que teria sido melhor vertida como: "Os Fundamentos da Religião Cristã"), temos a excelência dos seus comentários, como já apresentou o Dr. Mauro Meister, no seu post anterior.

Romanos foi o primeiro comentário escrito, em 1540, e, na seqüência, as demais cartas de Paulo. O comentário sobre a Segunda carta de Paulo aos Coríntios foi o terceiro livro escrito nessa série, concluído em agosto de 1546 (1 Coríntios foi concluído em janeiro de 1546; os comentários às demais epístolas de Paulo foram concluídos em 1548). Seu último comentário foi publicado em 1563. Todos esses livros foram originalmente escritos em latim. Para completar a totalidade da Bíblia, ficaram faltando: Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel. 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas, Esdras, Nemias, Ester, Jó, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, 2 e 3 João e Apocalipse). Quando Calvino faleceu, ele estava escrevendo o comentário de Ezequiel.
Seguindo o seu costume, Calvino iniciou o Comentário da Segunda Carta aos Coríntios com uma dedicatória feita a Melchior Wolmar Rufus, um alemão muito famoso, professor de Direito Civil, alvo de sua profunda gratidão. Teodoro Beza (1519-1605) escreveu o seguinte sobre Melchior Wolmar, em sua “Vida de João Calvino”: “A sua erudição, piedade e outras virtudes; em conjunto com suas habilidades admiráveis como professor de jovens, não podem ser suficientemente destacadas. Em função de uma sugestão sua e por sua atuação, Calvino aprendeu a língua grega”. Assim, em meio aos seus estudos de advocacia, Calvino, aos 22 anos de idade, aprende a dominar uma das línguas originais da Bíblia, formando o alicerce de sua vida eclesiástica, como exegeta, hermeneuta e teólogo.
João Calvino é reconhecidamente um exegeta, um hermeneuta e um mestre em poimênica, mas ele é, antes de tudo, um Teólogo Sistemático. Certamente ele é mais famoso por seu tratado de teologia – As Institutas. Mas é nos comentários que ele escreveu ao longo de sua curta vida, que ele demonstra o apreço que tem para a fonte de sua sistematização teológica – a Bíblia. Os Comentários são importantíssimos, pois derrubam a pecha de que Calvino é um racionalista cujas ilações contrariam não somente o bom senso, mas o próprio ensino da Palavra de Deus. Não pode ser aceita, portanto, a visão propagada por oponentes de Calvino, de que ele deixa a visão orgânica do Reino para trás e embarca em um delírio racional, que o leva a conclusões sobre a soberania de Deus não encontradas nas Escrituras. Ora, é exatamente na Palavra de Deus, estudando texto a texto, onde Calvino encontrará a base para reafirmar e extrair todas as suas convicções e ensinamentos. Não deve nos surpreender que Calvino, o teólogo sistemático, começasse comentando Romanos (que ele considerava a chave para a interpretação correta das Escrituras) e as cartas de Paulo aos Coríntios. Estes livros são sistemáticos na apresentação de doutrinas fundamentais da Fé Cristã, interpretando e aplicando os ensinamentos dos Evangelhos; explicando os fundamentos veto-testamentários; firmando os passos da igreja de Cristo na Nova Aliança.
É interessante, também, que mesmo quando Calvino se envolve em um mergulho profundo nos livros da Bíblia, trecho por trecho, para desvendar o seu significado e na busca das lições supremas registradas por Deus, ele não perde a visão sistemática das doutrinas. Assim, em seus comentários ele não se contenta apenas em dar um resumo do livro que passará a examinar, mas também apresenta “o argumento” que norteou o autor na escrita do livro: o desenvolvimento sistemático do raciocínio do autor, e a lógica argumentativa dos pontos que necessitavam ser estabelecidos pela carta.

Na segunda carta de Paulo aos coríntios (possivelmente a terceira que escrevia aos Coríntios, pois 1 Co 5.9, faz referência a uma primeira – antes de 1 Coríntios, possivelmente não inspirada, no sentido canônico), temos a continuidade de instrução a uma igreja marcada por graves problemas de conduta, eivada de incompreensões doutrinárias, que havia motivado duras repreensões da parte do apóstolo. As notícias mais recentes, entretanto, são encorajadoras (7.5-7) e é nesse clima que Paulo, em meio às suas instruções práticas, abre o seu coração, defende a sua autoridade apostólica e prepara aqueles irmãos para uma futura visita.
Calvino penetra no espírito dessa carta à Igreja de Corinto. Explicando palavra a palavra, ou frase a frase, conforme a necessidade – recorrendo ao seu extenso conhecimento da língua grega e fazendo comparações elucidativas – ele vai nos auxiliando o entendimento. Através do comentarista, passamos a entender Paulo melhor, não somente os seus sentimentos, mas as doutrinas cabais que procura passar aos seus leitores, como a abnegação do “eu”, ensinada em 1.3-11. Em Calvino, neste Comentário, encontraremos exposições magistrais, como por exemplo o ensino da pureza da Igreja, registrado em 6.14-7.1, onde ele nos dá o contexto completo da situação de envolvimento com descrentes vivida por alguns daquela igreja. Nesse trecho ele mostra que Paulo trata de questões que transcendem a comum aplicação ao matrimônio (“jugo desigual”), referindo-se à perda de foco do Povo de Deus e à promiscuidade relacional deste, com o mundo.
Ao relembrarmos o nascimento desse gigante de Deus, com ação de graças pelo seu legado, devemos orar para que o Soberano Senhor, através da leitura dos textos de Calvino, produza fruto de santidade e luz em nossas vidas.
Por Solano Portela

sexta-feira, 3 de julho de 2009

POR QUE CRISTO MORREU?

A morte de Jesus Cristo continua sendo, para muitos, um mistério ainda não compreendido. São poucos os que podem afirmar com clareza e convicção o significado e as implicações da morte de Cristo. Inclusive entre os cristãos, lamentavelmente, há pouco entendimento. Obras notáveis aparecem na história da igreja, tais como: “Por que Deus se fez homem?”, de Anselmo; “O Mediador”, de Brunner e “A cruz de Cristo”, de Stott, com o propósito de expor o mistério do Calvário. A Cruz é o centro da fé evangélica, ou como dizia Lloyd Jones, “é o coração do evangelho”. POR QUE CRISTO MORREU? Esta uma das mais solenes perguntas e a resposta a mais gloriosa de todas as verdades. Existem três expressões teológicas que nos ajudam a compreender o significado da cruz de Cristo.

1) A morte de Cristo é SUBSTUTIVA porque Cristo morreu por nós. A preposição “por” significa, em favor de ou em lugar de. Em outras palavras, Cristo assumiu o nosso lugar, Ele nos substituiu. Como diz a Palavra: “Deus prova o seu amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós (em favor de), sendo nós ainda pecadores” ( Rm 5.8). John Owen explicou essa substituição da seguinte maneira: “nós mesmos não fizemos nada daquilo que nos é imputado (salvação), nem Cristo fez nada daquilo que lhe é imputado (condenação)”. Como cantamos: “Ele morreu a nossa morte para vivermos sua vida”. Eis o gracioso amor de Deus!


2) A morte de Cristo é PENAL porque Cristo sofreu a nossa morte. Note bem! As Escrituras ensinam que o “salário do pecado é a morte” (Rm 6.23), uma evidência contundente do justo juízo de Deus. Todavia, Jesus Cristo, o Deus Homem era inculpável. Em sua natureza, caráter e conduta não havia absolutamente nada que tivesse uma pequena partícula de pecado. Logo, concluímos que Cristo sofreu a nossa morte. Nós pecamos e por isso somos merecedores da condenação, no entanto Ele assumiu a nossa pena.


3) A morte de Cristo é VICÁRIA porque Cristo morreu por nossos pecados. Um “vigário” é o que se coloca no lugar de alguém ou que representa alguém. Portanto, a morte de Cristo é vicária porque ele se colocou em nosso lugar e nos representou, recebeu a pena que merecemos. Paulo disse: “Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras” (1Co 15.3), e Pedro de igual modo afirmou: “Cristo morreu por nossos pecados de uma vez por todas” (1Pe 3.18).


Amigo, a morte de Cristo é a maior prova do amor de Deus por você. Se arrependa de seus pecados e creia na suficiência de Cristo para salvá-lo. Jamais se esqueça: Ele morreu, mas ressuscitou! Um dia todos nós iremos vê-lo face a face. Será uma hora de ruína para os que rejeitaram o seu grande amor. Por outro lado, será um dia de glória para aqueles que, entendo o significado de sua morte na cruz, o reconheceram Senhor e Salvador.

REFORMA E REAVIVAMENTO

Por - Rev. Hernandes Dias Lopes

A Igreja Evangélica Brasileira precisa de uma nova Reforma. Muitosdaqueles que se dizem protestantes já não protestam mais. Muitosdaqueles que se autodenominam evangélicos têm transigido com a verdade ecaído na malha sedutora do pragmatismo e das falsas doutrinas. Doutrinas estranhas têm encontrado guarida no arraial evangélico. Novidadesforjadas no laboratório do engano têm sido acolhidas com entusiasmo pormuitos crentes. Floresce em nossa Pátria uma igreja que tem extensão,mas não profundidade. Cresce em números, mas não em maturidade. Teminfluência política, mas não autoridade moral. Faz propaganda de umpretenso poder, mas transige com o pecado.

A Igreja Evangélica Brasileira precisa voltar às Escrituras. Muitospúlpitos estão sonegando aos crentes o pão verdadeiro e dando ao povoum caldo ralo e venenoso. Há aqueles que pregam o que o povo quer ouvire não o que o povo precisa ouvir. Pregam para entreter os bodes e nãopara alimentar as ovelhas. Pregam para arrancar aplauso dos homens e nãopara levá-los ao arrependimento. Pregam prosperidade e não salvação.Pregam curas e milagres e não novo nascimento. Pregam auto-ajuda e não aajuda do alto. Há muitas igrejas fracas e enfermas por estaremsubmetidas a um cardápio insuficiente e deficiente. A fraqueza e adoença começam pela boca. Há morte na panela. O veneno mortífero dasheresias perniciosas destila em muitas cátedras teológicas. Muitospúlpitos espalham esse veneno e muitos crentes se intoxicam com ele.Precisamos colocar a farinha da verdade nessa panela, a fim de que opovo tenha pão com fartura na Casa do Pão.

A Igreja Evangélica Brasileira precisa voltar às grandes doutrinas daReforma. Precisamos reafirmar que a Escritura é verdadeira, infalível,inerrante e suficiente e não podemos acrescentar à sua mensagem asrevelações, sonhos e visões que emanam de corações errantes. Precisamosreafirmar que a fé em Cristo é suficiente para a nossa salvação e nãopodemos acrescentar a ela as obras, os méritos nem o misticismovariegado tão incentivado em tantos arraiais. Precisamos reafirmar que agraça de Deus é a única base sobre a qual recebemos a nossa salvação. Ohomem não merece coisa alguma a não ser o juízo divino, mas de formabenevolente, Deus suspende o castigo e nos oferece seu favor imerecido.Precisamos reafirmar que não há outro nome dado entre os homens peloqual importa que sejamos salvos, além do nome de Cristo Jesus.Precisamos reafirmar que a glória pertence a Deus e não ao homem, igrejaou instituição humana.

A Igreja Evangélica Brasileira precisa não apenas de Reforma, mas,também, de Reavivamento. Não basta ter doutrina certa, é preciso tervida certa. Não basta ter apenas luz na mente, é preciso ter fogo nocoração. Não basta apenas conhecimento, é preciso ter fervor espiritual.Não basta apenas conhecer doutrina, é preciso ser transformado eimpactado por essa doutrina. A igreja de Éfeso tinha doutrina, mas lhefaltava amor. A igreja de Esmirna tinha amor, mas lhe faltava doutrina.Ambas foram repreendidas por Cristo. Precisamos de doutrina e amor,reforma e reavivamento. Não glorificamos a Deus com o vazio da nossamente e a plenitude do nosso coração nem glorificamos a Deus com aplenitude da nossa mente e o vazio do nosso coração. Deus não é exaltado quando deixamos de conhecer a verdade nem Deus é glorificado quandodeixamos de nos deleitar nessa verdade. Razão e emoção não são coisasmutuamente exclusivas. Elas se completam. A emoção que não provém de umamente iluminada pela verdade é vazia, rasa e inconsistente. Uma mente cheia do conhecimento da verdade, todavia, que não exulta de alegria esanto fervor está, também, em total desacordo com a vontade divina.
Oh!Que Deus nos desperte para o conhecermos verdadeiramente! Oh! Que Deusnos encha daquela alegria indizível e cheia de glória, a fim de que nosdeleitemos nele e passemos a viver tão somente para a sua glória!